terça-feira, 26 de março de 2013

Interdição do Engenhão: Novo capítulo da agonia do futebol do Rio de Janeiro

Estádio Olímpico João Havelange: Nem cinco anos de uso, e já apresenta problemas na estrutura

E a população do estado do Rio de Janeiro, principalmente os amantes de futebol, foi pega de surpresa nesta terça-feira pelo prefeito da capital Eduardo Paes, que anunciou no início da noite a interdição do Estádio Olímpico João Havelange, conhecido popularmente como Engenhão. Vamos analisar alguns fatos correlacionados a essa medida e seus desdobramentos.

A história do Engenhão


O Estádio Olímpico João Havelange, inaugurado em 30 de junho de 2007, foi uma das principais obras da gestão do então prefeito César Maia para a realização dos Jogos Panamericanos que ocorreram no mesmo ano no Rio de Janeiro. Com seu projeto concebido no ano de 1996 e iniciado em 2003, o Engenhão custou aos cofres do município a bagatela de 380 milhões de Reais, seis vezes mais do valor inicial previsto, que era de 60 milhões. Com capacidade para 46.931 pessoas, o equipamento deverá passar por uma ampliação para os Jogos Olímpicos de 2016, que aumentará sua capacidade para 60 mil espectadores, exigência mínima do COI (Comitê Olímpico Internacional). A previsão para o início dessa ampliação é para este ano de 2013.

O estádio foi arrendado pelo Botafogo de Futebol e Regatas a partir do dia três de agosto de 2007, tendo o clube o direito de exploração do espaço por 20 anos prorrogáveis por mais 20, ou seja, até 2047. Além do Botafogo, que é o administrador, o Engenhão abriga ainda como comodatários o Fluminense Football Club e o Clube de Regatas do Flamengo, que passaram a utilizá-lo após o fechamento do estádio do Maracanã para obras, em 2010. Outro clube que também utiliza o estádio frequentemente é o Clube de Regatas Vasco da Gama, mas apenas em clássicos contra os demais clubes grandes do Rio de Janeiro e em partidas de competições onde haja uma exigência mínima de disponibilidade de espaço. 

A interdição


No dia 26 de março de 2013, o então prefeito do Rio de Janeiro Eduardo Paes convocou uma reunião com representantes dos quatro grandes clubes do Rio de Janeiro (Botafogo, Flamengo, Fluminense e Vasco) e logo após uma coletiva de imprensa na qual comunicou a interdição do estádio. De acordo com Paes, as construtoras responsáveis pela construção do equipamento, a OAS e a Odebrecht, com fiscalização da RioUrbe (Secretaria de Obras do Município) detectaram que a cobertura do projeto apresenta problemas estruturais e oferece risco aos espectadores que utilizam o espaço, se levadas em consideração variáveis como velocidade do vento e temperatura. Os arquitetos responsáveis pela obra, Carlos Porto, Gilson Santos, Geraldo Lopes e José Raymundo Ferreira Gomes haviam dado um prazo de garantia que expirou no final de 2012. O prefeito do Rio informou ainda que não há uma data para a liberação do estádio. 

Consequências


O Engenhão foi interditado em um momento propício para uma série de debates, principalmente sobre a qualidade da construção e o interesse em fechar o equipamento para obras. O estádio do Maracanã, que foi inaugurado em 1950, passou por sua primeira reforma apenas em 1992, após a final do Campeonato Brasileiro vencido pelo Flamengo. Nesse ínterim, foram 42 anos servindo seguidamente ao público carioca até seu primeiro fechamento para reformas. O Engenhão, projeto que arquitetonicamente chama a atenção (principalmente de quem passa pela Linha Amarela, uma de suas principais vias de acesso), não tem seis anos de inaugurado e já apresenta falhas em sua estrutura. Dá pra apontar uma série de incompetências nesse caso. Primeiro do consórcio construtor, que se formos pesquisar a fundo será o mesmo responsável pela ampliação da arena. Consequentemente a RioUrbe, que não teve capacidade suficiente para apontar as falhas do projeto. E para fechar o pacote, as sucessivas administrações municipais que deram de ombros para o que estava acontecendo e só tomaram uma atitude quando o risco de tornou iminente. Ou então, para os mais exaltados, existe uma má fé de construir um equipamento que num futuro muito próximo terá problemas só para ganhar duas vezes.

Dado importante: a Odebrecht também é responsável pelas obras do Maracanã, juntamente com a Andrade Gutierrez (a Delta também era parceira, mas saiu após os escândalos envolvendo seu nome com o do bicheiro Carlinhos Cachoeira). Então não se surpreendam se acontecer daqui a alguns anos a mesma coisa que está acontecendo no Engenhão. 

O futebol no Rio de Janeiro


Por mais que diversos setores da mídia espalhem aos quatro ventos que há um crescimento de investimento no futebol do estado, o cenário é completamente diferente. O futebol no Rio definha, e a prova cabal disso é o baixo interesse do público no Estadual. Com o fechamento do Maracanã e agora do Engenhão, o Rio de Janeiro não tem um estádio de grande capacidade. Os únicos estádios liberados pela Polícia Militar para a realização de partidas dos quatro grandes clubes são o de São Januário, do Vasco (capacidade 24.584 pessoas), o de Moça Bonita, do Bangu (capacidade 9.564 pessoas), Raulino de Oliveira, em Volta Redonda (capacidade 21.000 pessoas), e o Cláudio Moacyr, em Macaé (capacidade 15.000 pessoas). Desses, nenhum possui autorização da PM para a realização de clássicos entre dois times grandes (tanto que o Vasco vem tentando há anos e sempre tem seus pedidos indeferidos, tendo sido realizado o último clássico em São Januário no ano de 2005). Além disso, outras arenas estão completamente abandonadas. É o caso por exemplo do estádio Giulite Coutinho, localizado em Édson Passos e pertencente ao América, do Caio Martins, localizado em Niterói e arrendado pelo Botafogo, e do Godofredo Cruz, que fica em Campos e é administrado pelo Americano. São equipamentos que já receberam por diversas vezes equipes grandes, mas que sofrem com o descaso tanto de seus mandatários quanto da Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro (FERJ) e do poder público.

Nesse lamaçal que se tornou o futebol do Rio, não faltaram promessas. O prefeito do Rio Eduardo Paes, no início das obras do Maracanã, prometeu uma grande reforma também no estádio Moça Bonita, que segundo suas palavras seria utilizado como campo de treinamento auxiliar para a Copa do Mundo de 2014. No entanto o estádio, que pertence ao Bangu, nem receber partidas à noite pode, pois não existe iluminação artificial. O mais engraçado de tudo é que agora a PM deve acenar com a possibilidade de liberação de São Januário para clássicos (Vasco x Botafogo e Fla x Flu). E depois, quando os outros estádios estiverem liberados, vai inventar mais uma desculpa esfarrapada para proibir de novo o uso. Pura conveniência.

Para completar, tem o prejuízo do Botafogo de Futebol e Regatas com o fechamento do Engenhão. O clube utiliza o espaço como um dos principais atrativos para captação de recursos, com exposição de imagem e aluguel para eventos e shows. Com o fechamento, a diretoria do clube já cogita a remodelação de Caio Martins, o que convenhamos, já deveria ter sido feito há muito tempo. E o presidente Maurício Assumpção, em entrevista coletiva no dia da interdição, também acenou com a possibilidade de responsabilizar os envolvidos na ação de fechamento e cogitou indenização. Sinceramente, não acredito que o Botafogo ou qualquer outro clube de futebol tenha essa força no Brasil, de bater de frente com a administração pública e com a máfia das empreiteiras.

Ficam aí um monte de discussões iniciadas. Abraços!

quarta-feira, 13 de março de 2013

Bergoglio: Mudanças na Igreja acontecerão, mas somente dentro dos muros



Depois de eleito o novo papa, o argentino Mario Jorge Bergoglio, nada melhor do que uma pequena análise sobre os possíveis rumos da Igreja Católica neste início de Século XXI, uma instituição que tenta se encontrar e recuperar o espaço que vem perdendo gradualmente nas mentes e corações de seus fieis.

A escolha de Bergoglio, agora Papa Francisco I, reflete quais são as principais pautas do Vaticano após a saída de Bento XVI (Joseph Ratzinger). Conhecido entre seus pares como linha dura e disciplinador, o novo pontífice foi escolhido com a missão de dar um basta nos rachas políticos existentes na igreja, moralizar a instituição que no atual momento está manchada por acusações vindas de vários países, e que vão de lavagem de dinheiro à pedofilia, e retomar o rumo pretendido pela cúpula católica ao eleger Ratzinger como papa, que é priorizar um único rumo para a igreja voltado para a reafirmação da fé e dos costumes rígidos. E neste processo o novo líder católico tem vários fatores que contam a seu favor.

Francisco I é famoso por ter tido posições duras e rápidas em relação aos escândalos sexuais acontecidos na Igreja Católica na Argentina, punindo exemplarmente pedófilos, quando era arcebispo de Buenos Aires. E essa é a principal aposta do Vaticano. A presença de um homem com mão-de-ferro no poder pode servir como exemplo para os demais, já que os fieis esperam respostas rápidas de suas lideranças para encerrar de vez a chuva de acusações relacionadas à permissividade e a negligência dos setores católicos nas denúncias. A mesma esperança está presente na cúpula vaticana, quando elegeu Bergoglio para colocar ordem na casa. A Igreja Católica neste momento é uma instituição com enormes disputas de poder, e esses rachas internos já começavam a ameaçar a unidade entre suas ordens constituintes. Cabe ao novo papa balançar as estruturas e reorganizá-las da sua forma. Isso é claro, se não sofrer pressões ou interferências em sua tarefa.

Outro ponto importante a favor de Francisco I é o fato de pertencer a um dos setores da Igreja Católica mais admirados e reverenciados por seus fieis. Os jesuítas, um dos principais grupos responsáveis pela colonização e disseminação da Igreja Católica na América Latina, são a maior ordem religiosa católica do planeta com quase 20 mil representantes em 112 países. Essa extensão de poder possibilitará uma contra-ofensiva visando resgatar os fieis que o catolicismo vai perdendo para as doutrinas protestantes em todo o planeta, fenômeno representado no Brasil pelo neopentecostalismo e pela teologia da prosperidade. A doutrina franciscana baseada na humildade e na renúncia pode ajudar a humanizar a Igreja Católica no sentido de comunhão entre os povos.

Mas é claro que há limites, e aí estão os pontos negativos da eleição do cardeal Bergoglio. O novo papa, que tem 76 anos de idade, mostra que a cúpula do Vaticano não tem interesse em outro pontificado longo como o de João Paulo II, posição já mostrada com a eleição de Bento XVI, na época com 78 anos. Por conta disso, os documentos do Concílio Vaticano II, que podem possibilitar um início de reforma da Igreja Católica e adaptação da doutrina cristã da entidade para os novos tempos, dificilmente serão discutidos e continuarão guardados no mesmo lugar, onde estão desde 1965. Outro ponto negativo é a posição inflexível em temas atuais como o aborto, os preservativos, e as questões LGBT. Claro que ninguém esperava um pontífice que fosse abertamente favorável a uma mudança radical no catolicismo. No entanto, nem mesmo haverá a possibilidade de debate sobre esses temas, e o Vaticano continuará se escondendo atrás de leituras arcaicas para defender posições que nem sempre são coerentes e seguidas por seus fieis (ou alguém quer me enganar que católico não usa camisinha?).

A questão político-religiosa será outro ponto de tensão entre o novo papa e o restante do mundo. Até que ponto Francisco I será capaz de se despir das vaidades e fomentar o debate sobre a tolerância religiosa no planeta, como iniciou João Paulo II no final de seu pontificado? Nesse sentido, o catolicismo precisará aprender a conviver com dogmas que são minorias em países onde é a religião dominante, e impor sua presença em Estados onde é minoria. É um esforço complicado, ainda mais se tratando de uma entidade que em mais de mil anos foi a dominante em todo o mundo ocidental.

Desafios existem aos montes na questão religiosa. Dentre eles, elejo a busca da tolerância, do reconhecimento e da comunhão entre as individualidades como o maior deles. A Igreja Católica não pode virar as costas para o mundo contemporâneo e deve buscar levar à risca o principal mandamento de Jesus Cristo: “Amai-vos uns aos outros como eu vos amei, e ao próximo como a ti mesmo”. Independente se este pensa, age, tem escolhas diferentes e vive sob outros dogmas ou até mesmo sem dogma. Pois o importante é a bondade presente nos corações dos seres humanos. E isso não é a religião que vai ensinar, mas o caráter.

Boa sorte, iluminação e tolerância a Francisco I, o novo pontífice.